Clã Bolsonaro e aliados insuflaram atos de contestação à eleição e à ordem

Desde que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) perdeu a corrida eleitoral em que buscava ser reconduzido ao cargo, em outubro do ano passado, lideranças bolsonaristas alimentaram, de forma direta ou indireta, a desconfiança no resultado das urnas.

As falas e atitudes justificaram os bloqueios e atos antidemocráticos que se espalharam pelo país desde o encerramento do segundo turno, e culminaram na invasão e depredação dos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal neste domingo.

Um dos ex-ministros de Bolsonaro, o ex-titular do Turismo, Gilson Machado, chegou a divulgar um vídeo da invasão com a legenda “ou ficar a pátria livre ou morrer pelo Brasil”, embora a maioria dos apoiadores tenha permanecido em silêncio ou condenado os ataques. A publicação foi apagada momentos depois.

Bolsonaro, Mourão e parlamentares incentivaram desconfiança
Bolsonaro, porém, já alimentava uma suspeita infundada sobre a lisura das urnas eletrônicas antes do pleito. Após a derrota, permaneceu durante quase dois dias em silêncio, e não parabenizou Lula pela vitória.

Desde o primeiro discurso depois do resultado, defendeu que os atos que contestavam as urnas eram “fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral” e que, ao contrário dos acusadores, sempre “jogou nas quatro linhas da Constituição”, embora todas as alegações de fraudes tenham sido consideradas sem evidências pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Na época, chegou a pedir, em vídeo publicado no Twitter, a desobstrução das vias pelos seus apoiadores mais extremistas, mas disse que as manifestações eram legítimas. “Proteste de outras formas, em outros locais, porque isso é muito bem-vindo (…) Vamos fazer o que tem que ser feito. Estou com vocês, e tenho certeza que vocês estão comigo”, disse.

Aliados fizeram coro ao movimento, a decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspenderam contas de políticos por “atentarem contra a Justiça Eleitoral” e “romperem com a ordem constitucional”. O fato gerou críticas pelo filho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL – RJ).

Em postagem, ele estimulou as manifestações que questionavam a vitória de Lula e afirmou que “a reação das autoridades competentes ante tudo o que está sendo exposto é apenas a censura, ao invés de esclarecimentos. Não vamos desistir do nosso Brasil!”, segundo escreveu no Twitter.

A deputada federal Bia Kicis (PL – DF), uma das que tiveram as contas suspensas, em publicação do dia 22 de novembro, disse que o que a interessava era “a lisura do pleito”. “Não tenho medo de lutar pela verdade. O povo quer transparência!”, escreveu um dia depois de ter denunciado uma “verdadeira ditadura do Judiciário”.

Já Carla Zambelli (PL – SP) gravou um vídeo direcionado a generais do Exército em que perguntava se eles “vão querer prestar continência a um bandido ou à nação brasileira”. Ela afirmou ainda que “não é hora de responder com carta se dizendo apartidário. É hora de se posicionar”.

Outro aliado do ex-presidente que instigou as manifestações contrárias ao resultado foi o ex-Comandante do Exército General Villas Boas, em nota publicada no Twitter. “A população segue aglomerada junto às portas dos quartéis pedindo socorro às Forças Armadas”, disse, acrescentando que os protestos eram contra as supostas “ameaças à liberdade e as dúvidas sobre o processo eleitoral”.

O ex-vice-presidente, e atual senador, Hamilton Mourão (Republicanos – RS), também fez coro à legitimidade dos questionamentos em postagem na rede social. “O clamor das manifestações a que assistimos desde a proclamação do resultado das urnas, que permaneceram sem o voto impresso e auditável, é legítimo, por mais que muitos tenham tentado classificá-lo de ‘antidemocrático’”, escreveu em dezembro.

Mesmo no final do mês, tendo passado a diplomação de Lula e a posse tendo sido confirmada, outros sinais de lideranças bolsonaristas ajudaram a instigar a resistência ao presidente eleito entre os apoiadores mais radicais do ex-mandatário.